Oficina 3

Etapa 2

As figuras de linguagem na prática

Nesta etapa, faremos a leitura da crônica “O novo normal” de Antonio Prata, disponível na coletânea deste Caderno, que trata da realidade instaurada pela pandemia do Coronavírus. Também retomaremos outras crônicas já lidas em oficinas anteriores: “Conduções”, de Lilia Guerra, e “Tatuapé, o caminho do tatu”, de Daniel Munduruku.

Atividades

  1. Antonio Prata é um cronista que costuma publicar suas crônicas em um grande veículo da imprensa, o jornal Folha de S.Paulo. Peça que a turma pesquise informações a respeito e tragam-nas, para vocês conversarem.
  2. Depois, leia com a turma a entrevista concedida pelo escritor clicando aqui.
  3. Feita a leitura, destaque fragmentos em que o autor fala especificamente sobre o gênero crônica. Por exemplo:
    “Acho que crônica é uma espécie de lupa que você coloca em um assunto. E qualquer assunto que você olhar com uma lupa é interessante.”
    “[…] consigo ir puxando esse fio para ver aonde ele leva. A crônica é um exercício livre de escrita. Você não precisa de uma história. Uma das graças de escrever é ver onde aquilo vai dar.”
    “Muitas vezes também a crônica não nasce de algo vivido; às vezes eu crio uma situação, um encontro com uma pessoa, um vizinho. A crônica não é um relato fiel, a situação que eu estou dizendo que aconteceu, muitas vezes não aconteceu, é ficção.”
  4. Ao debater com a turma, saliente a noção apresentada por Prata sobre a crônica como uma lupa colocada num assunto, destaque o aspecto da liberdade que o gênero possibilita e, ainda, da invenção. É importante que as(os) alunas(os) reconheçam que, na mesma medida em que a crônica abre espaço para o registro do cotidiano, esse cotidiano não precisa ter sido realmente vivido por aquele que a escreve, mas sim pode ser projetado a partir de alguma situação, estendida pela inventividade da(o) escritora(or).
  5. Leia a crônica com a turma de maneira coletiva ou individual.
  6. Após a leitura, peça para que a turma compartilhe sua interpretação da crônica. Em seguida, ofereça a análise do box abaixo e estabeleça relações com o que as(os) estudantes trouxeram.

Sobre “O novo normal”

A crônica de Prata é marcada pelo humor, mas uma dose de humor que alcança a ironia. Diante da situação complexa e difícil da pandemia do Coronavírus, o cronista escolheu o caminho do humor ácido.

E é com um tom bastante irônico que ele comenta a chegada desse personagem que está no centro do texto como protagonista, o Novo Normal. Sem saber ao certo de quem se trata, Prata imagina uma festa onde o personagem vai sendo apresentado para as pessoas que estão ali. De forma ficcional, o cronista vai exercitando a reação das pessoas para esse personagem.

Como tudo o que é novo, o Novo Normal causa estranhamento nos primeiros momentos da conversa, mas, com o passar das horas e a convivência com os outros convidados, torna-se uma figura enturmada. Ou seja, a figura que já se tornou natural, comum. E aí encontramos uma visão metafórica sobre a situação da pandemia iniciada no ano de 2020.

A crônica está estruturada em diálogos, os quais, diferentemente de um texto corrido, nos contam uma história por meio de frases que os personagens trocam. É essa troca de falas que vai construindo a sequência dos episódios, até a hora do término da festa, em que todos, já superamigos, saem festejando e cantarolando por uma das principais ruas de São Paulo.

Ao usar palavras comuns às conversas e leituras do dia a dia das pessoas, o texto tem fácil leitura e comunicação, o que nos mostra que o autor escolheu essa seleção de palavras para deixar o texto fácil de ser compreendido, num papo direto e reto com o maior número possível de leitores.

7. Agora vamos fazer o reconhecimento de figuras de linguagem presentes em algumas crônicas, começando pelo texto de Antonio Prata.

“O novo normal”, Antonio Prata

“Uma convidada abandona (1), discretamente, a taça de vinho sobre uma mesa.

Um convidado dispensa (1) uma empada num vaso de pacová.

1- eufemismo: no lugar de escrever que a convidada joga a empada fora, o autor ameniza, dizendo que ela “dispensa”. O mesmo com a taça de vinho: no lugar de dizer que a pessoa deixa de lado, diz “abandona”.

Metáfora é uma figura de linguagem que também está presente no texto, pois o autor apresenta o Novo Normal como um personagem, que ganha corpo e vida, como uma metáfora para abordar a situação das restrições e do isolamento social com a pandemia do Coronavírus.

“Conduções”, de Lilia Guerra

A carcaça de uma poltrona repousa (1) na esquina da Nascer. Apresenta cicatrizes de queimadura.” (1)

“Se divertem assistindo ao balé das labaredas.” (2)

“As ruas daqui são pobretonasDesvalidas.” (3)

“Tento passar indiferente por essas pessoas jogadas nos colchões úmidos pelos líquidos da madrugada.” (4)

1- personificação: a poltrona ganha uma carcaça, que normalmente é um elemento do corpo de um animal, e tem cicatrizes.

2- personificação: as labaredas passam a dançar, ou seja assumem uma ação humana.

3- personificação: as ruas passam a adquirir qualidades e ações dos seres humanos.

4- metáfora: referência a líquidos como urina, chuva e bebidas.

“Tatuapé, o caminho do tatu”, de Daniel Munduruku

“Ficava muito tempo atrás desse tatu (1), apenas para observar o caminho que ele fazia.”

“É ele que faz o seu caminho, mostra a direção, rasga os trilhos como quem desbrava. É ele que segue levando pessoas para os seus destinos.” (2)

“Pensei também no tempo de antigamente, quando o Tatuapé era um lugar de caça ao tatu.” (3)

“Andando no metrô que seguia rumo ao Tatuapé, fiquei mirando os prédios que ele cortava como se fossem árvores gigantes de concreto.” (4)

1- metáfora: o narrador compara o trem a um tatu e busca transmitir a ideia de que ele observava atentamente o trajeto do metrô, assim como alguém que segue de perto a movimentação de um tatu.

2- personificação: são atribuídas características humanas ao metrô, destacando o papel ativo do trem na condução das pessoas e na abertura de caminho através dos trilhos.

3- metonímia: o termo “Tatuapé” é utilizado para se referir a um lugar específico associado à caça do tatu. Nesse caso, o nome do bairro é utilizado para representar a atividade de caça aos tatus que provavelmente ocorria na região.

4- comparação: o autor faz uma comparação entre os prédios e árvores gigantes de concreto, para ressaltar a imponência e a altura dos edifícios, fazendo uma analogia entre elementos naturais (árvores) e elementos construídos pela humanidade (prédios).

No início desta etapa, a turma teve a oportunidade de se familiarizar com o escritor Antonio Prata. Agora, aproveite a ocasião para apresentar Lilia Guerra e Daniel Munduruku, cronistas que escreveram os textos trabalhados acima.

Lilia Guerra

Lilia Guerra nasceu em 1976, na cidade de São Paulo. Ela fez sua estreia literária com o romance Amor Avenida em 2014 e, em 2018, publicou sua segunda obra, a coletânea de contos Perifobia, finalista do Prêmio Rio de Literatura. Em 2021, lançou o romance Rua do Larguinho e outros descaminhos e, no ano seguinte, em 2022, publicou Crônicas para colorir a cidade e Novelas que escrevi para o rádio, coletânea de novelas em três volumes. Suas histórias costumam abordar o dia a dia de pessoas que habitam as periferias brasileiras. Para saber mais sobre Lilia, confira a entrevista que ela concedeu ao Portal Escrevendo o Futuro.

Daniel Munduruku

Nascido em Belém, no ano de 1964, Daniel Munduruku é professor, escritor e ativista indígena, pertencente ao povo Munduruku. Com uma carreira literária abrangente, o autor publicou mais de 60 livros no Brasil e no exterior, acumulando diversos prêmios em reconhecimento à sua obra. Em seus livros e palestras, costuma destacar o papel das populações indígenas na constituição da sociedade brasileira. Saiba mais sobre o autor no vídeo a seguir.