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Portal Escrevendo o Futuro
24 de setembro de 2009
Ao falarmos sobre narrativas transmitidas oralmente, logo vem à mente uma série de questões: desde quando elas existem? Qual a finalidade de sua existência na cultura humana? Por que o homem é atraído pela narratividade desde tempos muito distantes? Os estudiosos dessas questões, notadamente os do final do século XIX e início do século XX, buscaram respostas na comparação entre as narrativas da tradição oral de seus países e as de povos que, na época, ainda não tinham escrita. Além disso, nos países ocidentais, estudaram os mitos das culturas clássicas, como a grega e a romana, e da cultura germânica e celta, e foram também pesquisados os orientais, como os dos árabes, indianos e chineses. Por meio desses estudos concluíram que os mitos foram as primeiras formas de narrar que a humanidade criou e que os demais gêneros narrativos que foram surgindo ao longo da história, nas diversas partes do mundo, deles descendem.
A partir dos mitos, que tinham função religiosa e estavam ligados aos rituais de iniciação dos adolescentes nas tribos, aos poucos vai se configurando a literatura contemporânea que, em seus diferentes gêneros, está a serviço do imaginário humano e do deleite que a ficção e arte literária proporcionam.
Historicamente, então, é possível traçar uma linha genealógica do conto: mito -> conto da tradição oral ou literatura oral em seus diferentes gêneros -> conto da literatura escrita em seus diferentes gêneros. É importante lembrar que essa linha varia de povo para povo: atualmente existem povos que não têm escrita e cujos estágios narrativos são ainda iniciais. Também é importante considerar que povos sem escrita não são menos importantes e com cultura mais pobre. Ao contrário, as narrativas da tradição oral têm tal força que conservam seu encantamento e são importantes caminhos para o imaginário e para o desenvolvimento humano, mesmo em países em que já circulam em sua forma escrita.
Entre os gêneros contos da tradição oral, o conto maravilhoso se destaca pelas referências ao mundo oriental onde nasceu. A transmissão inicial desse gênero para países do ocidente foi feita, muito provavelmente, na época em que a Europa entrou em contato com o oriente, a partir do século XII com a viagem de Marco Polo, e expandiu-se no período das Grandes Navegações.
Esses contos, ao mesmo tempo, tinham semelhanças e diferenças com os demais contos da tradição oral que já circulavam no ocidente (como os contos de ensinamento, os de fadas, os de animais). O que os distinguia estava na base temporal e espacial em que os contos maravilhosos foram criados: o espaço dos países ou nações orientais eram territórios desconhecidos, o que favorecia o levantamento das mais variadas hipóteses, estimulando a imaginação; o tempo a que os contos orientais remetiam, o tempo da aventura. Nesse tempo-espaço da aventura em países exóticos era possível evocar maravilhosos palácios, sultões e odaliscas, jovens pobres e valentes, princesas lindíssimas prometidas a velhos ricos, tapetes mágicos e jóias, e todos os demais componentes possíveis de um mundo mais imaginado do que conhecido. Os contos trazidos dessas viagens encantavam o público ouvinte ocidental possivelmente porque o imaginário podia ser mais facilmente acessado por meio das fantasias que os mundos desconhecidos alimentam.
Embora tenham origens diferentes, tanto os contos maravilhosos orientais como os contos de fadas têm na presença do sobrenatural um importante elemento: é por meio dele que o herói consegue suplantar o mal e concluir sua aventura. Nos contos de fadas, são as fadas – personagens da mitologia celta – que auxiliam o herói; nos contos maravilhosos são objetos como tapetes ou lâmpadas, gênios ou animais fantásticos que permitem que o herói vença os obstáculos que a vida lhe impõe. Nos contos de fadas, em geral, o herói procura um aperfeiçoamento existencial; nos orientais, o herói procura sair da miséria por meio do sucesso material.
Como contos tradicionais, ambos têm elementos semelhantes: uma situação inicial, um conflito – em razão do qual o herói se afasta de casa e tem que enfrentar desafios – peripécias, perigos, surgimento do elemento mágico, resolução do conflito, desfecho.
Os contos orientais estão reunidos na coletânea mundialmente famosa, As mil e uma noites. Entre os mais famosos, estão Simbad, o Marujo, Aladim e a Lâmpada Maravilhosa, Ali Babá e os Quarenta Ladrões.
Embora tenham diferenças sutis, uma coisa é certa: quando lemos ou ouvimos os antigos contos da literatura de tradição oral (contos maravilhosos ou de fadas), fazemos uma viagem, somos transportados pelos caminhos do herói que, ao vencer os percalços da aventura mítica, ganha batalhas internas e externas, se torna forte e adulto. Na trajetória do herói pela eterna batalha da vida, o leitor/ouvinte nela se reconhece e também ganha forças para prosseguir.
Da mesma forma, ao entrarmos no mundo da arte por meio de outros gêneros da literatura, é como se nos desligássemos da realidade e passássemos a outro plano. Essa “viagem” temporária nos descansa, cria um intervalo que nos reabastece para que possamos voltar a lidar, fortalecidos, com a realidade do cotidiano.
É por essas razões fundamentais que o trabalho com literatura na escola deve ser permanente...
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