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Vinícius de Moraes

Vinícius de Moraes

texto - Zélia Gattai; ilustração - Criss de Paulo

01 de agosto de 2011

Professor em busca de leitores

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Graças a uma das visitas de Vinicius à nossa casa, salvou-se a série de canções para crianças, de sua autoria:

À beira da piscina, o inseparável copo de uísque ao lado, violão em punho, Vinicius cantava.

Faço um parênteses para me desculpar. Na afobação de querer contar logo a história que me veio à memória como já devem ter percebido, não tenho anotações, tiro tudo da cachola à medida que as lembranças chegam esqueci=me de pedir licença para, ainda uma vez, avançar no tempo. Peço agora, pois devo explicar como foi que as músicas infantis de Vinicius de Moraes se salvaram. Avanço tanto, tanto, que falo até de meus netos, os três que existiam na época: Mariana, Bruno e Maria João.

Nessa ocasião, o amor de Vinicius, sua mulher, era uma baiana, Gessy Gesse, a quem devemos a vinda do poeta à Bahia, onde até uma casa ele construiu, disposto a ancorar entre o mar e os coqueiros de Itapuã. Estávamos à beira da piscina e Vinicius cantava como foi dito quando chegaram meus três netos.

Eu agora vou cantar umas musiquinhas para vocês, disse Vinicius às crianças, e começou: Era uma casa muito engraçada, não tinha teto, não tinha nada... Espera aí, interrompi, vou buscar um gravador. Assim dizendo saí ligeiro. Voltei em seguida, gravadorzinho ligado e ele recomeçou: Lá vem o pato, pato aqui, pato acolá... Cantou todas as canções, intercalando entre elas uma chamada: Esta é para Marianinha!... Esta é para Bruninho!... Esta é para Maria João!... Encantadas, as crianças ouviam as músicas pela primeira vez, pois elas ainda não haviam sido gravadas naquela ocasião. Ao saber que não restara nenhuma gravação delas após a morte de Vinicius, entreguei meu cassete à Gilda Queiroz Matoso, última e amada companheira do poeta até seus derradeiros momentos. Gravação precária, porém a única que restou e é a que se ouve até hoje.

Vinicius tornou-se íntimo de Calasans Neto e Auta Rosa, adorava o casal, alugou casa em Itapuã antes de construir a própria, queria ficar perto deles.

A rua da Amoreira, onde moravam e moram até hoje Calasans e Auta Rosa, era um horror: lama, buraqueira e, como se isso não bastasse, havia esgoto a céu aberto.

Frequentador assíduo da casa, inconformado com a situação dessa rua, Vinicius não teve dúvida, redigiu uma petição em versos ao prefeito de Salvador. No poema, verdadeiro primor, pedia-lhe atenção e carinho para a rua.

Combinou com Jorge, que conseguiu a publicação do poema-petição na primeira página do jornal A Tarde.

 


Tiro e queda, a resposta do prefeito foi imediata, em pouco tempo a rua de Auta e Calá foi consertada e asfaltada e, diga-se de passagem, ela foi, por algum tempo, a única rua asfaltada das imediações.

Naqueles tempos, a decantada beleza de Itapuã se resumia no mar, nas praias, nos coqueirais e nas canções de Dorival Caymmi.

Para festejar o acontecimento, Jenner Augusto e Luísa ofereceram um almoço ao qual Vinicius compareceu vestido de gari da limpeza pública, levando para Calá e Auta a petição, enquadrada.

Texto extraído do livro A casa do rio Vermelho (Rio de Janeiro: Record, 1999, p. 127).

Zélia Gattai Amado [São Paulo (SP), 1916 – Salvador (BA), 2008]. Memorialista, escritora de literatura infantil e romancista. Filha de imigrantes italianos e caçula de cinco irmãos, vive em São Paulo toda a infância e adolescência. Influenciada pela militância do pai no movimento operário, torna-se anarquista. Aos 20 anos, casa-se com o intelectual e membro do Partido Comunista Aldo Veiga, com quem tem um filho. Separada de Veiga, em 1945, em uma manifestação pela anistia dos presos políticos, conhece em São Paulo o romancista Jorge Amado (1912-2001), com quem se casa meses depois. Amado é eleito deputado federal, em 1946, pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro), então, eles se mudam para o Rio de Janeiro. Com o PCB declarado ilegal e seus integrantes perseguidos, logo partem para o exílio em Paris, onde vivem por três anos. Nesse período, Zélia estuda civilização francesa, fonética e língua francesa, na Universidade de Sorbonne. Entre 1950 e 1952, vive na Tchecoslováquia, e começa a fotografar, registrando momentos importantes da vida do marido. Em 1963, muda-se para Salvador. Aos 63 anos, publica seu primeiro livro, Anarquistas, graças a Deus. Escreve também literatura infantil, como Pipistrelo das mil cores, de 1984. É eleita, em 2001, para a ABL (Academia Brasileira de Letras), para a cadeira ocupada por Amado, a de número 23.

Enciclopédia Itaú Cultural-Literatura Brasileira. Disponível em http://itaucultural.org.br.

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