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O ensino como aprendizagem

O ensino como aprendizagem

texto - Rosiane Paes Silva; ilustração - Criss de Paulo

14 de agosto de 2023

Palavra de educador(a): viver para contar e contar para viver. Experiências da 7ª edição da Olimpíada de Língua Portuguesa

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Minha paixão pelas produções audiovisuais iniciou quando eu era bem jovem. De registros caseiros da família, logo em seguida eu estava produzindo vídeos para a minha comunidade “Santa Teresinha”, no Parque Caçula, que fica em Magé, na região metropolitana do Rio de Janeiro. Sempre que precisavam de algum vídeo, seja para alguma homenagem, seja para apresentar o trabalho missionário da Capelinha de Santa Teresinha, era eu quem procuravam. “Terá vídeo? Então é a Rosiane que vai fazer”. Até hoje é assim. Um simples passeio de bike é motivo para se tornar uma produção e levar as pessoas a reflexões. Foi o caso do último vídeo que produzi, o Turistando de bike pelo caminho do ouro1, que está no meu canal do YouTube.

Só sei que foi assim que comecei a me encantar por cinema e a ter essa curiosidade quase autodidata em produzir vídeos e editá-los. Quando fiquei sabendo da Olimpíada de Língua Portuguesa, vi que era uma grande chance para trazer à tona um desejo que sempre andou guardado nos meus porões: estudar a linguagem audiovisual. E ainda teria a oportunidade de usar essa paixão pessoal como ferramenta pedagógica. Não tinha a mínima pretensão de chegar à Semifinal; o que fez meus olhos brilharem foi poder adquirir todo aquele conteúdo e aprendizado.

Quando iniciei as oficinas de linguagem audiovisual, quão divertidas foram essas aulas! Mesmo on-line, eu sempre deixava os alunos instigados porque logo no início das oficinas anunciava que lançaria um desafio valendo nota para o bimestre. Com isso, eles participavam ativamente e, de certa forma, também visitavam seus porões. Um dos desafios que marcaram essas oficinas foi o de filmar sem cortes uma cena do portão de casa até a tela do computador. Imagina só! Saíram coisas engraçadíssimas, desde um gato atravessando as filmagens e quase derrubando o estudante Henry Gonçalves Nogueira, até o choro incansável da irmã menor da estudante Isys Gomes Alves de Oliveira, que assustou com a correria para a produção das filmagens. Nesse exercício de “travelling”, eles viram na prática o efeito do movimento de câmera sem cortes e o resultado que ele provoca.

Mesmo as aulas sendo remotas, a presença assídua dos estudantes mostrou que eu estava no caminho certo. Tivemos, todos, um amadurecimento, que abriu nossos horizontes para novas maneiras de enxergar um vídeo, um documentário, um texto, uma produção. O bloco “Situando o gênero Documentário”2, por exemplo, foi uma grande escola – estudamos sobre o que é, tipos, estratégias e alcance de um documentário. Foi um aprendizado coletivo. Embora eu tivesse uma paixão pessoal, na verdade, nada sabia sobre os documentários.

Em uma dessas oficinas, propus aos alunos que produzissem um curta-metragem de cunho poético, com duração de um minuto. Yuri Antônio de Souza filmou o caminho para a casa de sua avó, que vivia em outra cidade. Foi de ônibus e aproveitou para fazer as filmagens no trajeto. Na edição, ele colocou as imagens de trás para frente e recitou em voz over a poesia “Passageiro”3, de sua autoria. Foi quando eu vi que era isso que eu queria para a minha vida. Ir com essa linguagem para além da sala de aula. Sair dos muros da escola. E eles tinham potencial para isso. Daí também saiu o start para eu iniciar uma pós-graduação em Cinema e Produções Audiovisuais, assim eu ensinaria com mais propriedade.

Colocando as imagens de trás para frente, assim como fez o Yuri, penso que esse trabalho tinha tudo para dar errado! Pandemia, ensino remoto, alunos todos recém-chegados de escolas públicas municipais e uma professora que eles acabaram de conhecer. Em meio a isso, tive que convencê-los a participar da Olimpíada. Imaginem! E depois, como mandá-los sair de suas casas para produzir algo inédito sobre o lugar onde vivem quando a recomendação era isolamento social? O que fizemos, então? Trabalhamos primeiro todo o conteúdo, e combinamos de deixar a produção do vídeo para o mês de julho, confiantes de que a pandemia seria controlada através da vacinação. O mês de julho chegou, entramos na bandeira amarela e os estudantes puderam começar a sair de suas casas com segurança para realizar as gravações.

O que tinha para dar errado simplesmente deu mais certo do que eu imaginava: fomos parar na Semifinal! Os estudantes curtiram muito a formação, que foi toda on-line. Ficávamos comentando pelos bastidores do WhatsApp o que estava rolando na Olimpíada, e por lá eles mandavam fotos dos pais e irmãos, também assistindo às lives e aos documentários utilizados na formação.

Ao chegar na Semifinal, algo novo tinha acontecido: encarnamos o espírito olímpico! Ousamos sonhar com a medalha de ouro. A experiência da Semifinal é “perturbadora”, uma mescla de sentimentos. “Somos semifinalistas. E agora?” No entanto, não fomos para a final. E um sentimento de frustração pairou no ar. Isso soa até cômico, já que lá no início não tínhamos ambição alguma pela premiação. Choramos juntos!

Porém, o nosso desejo de continuidade já não caberia em uma medalha. A paixão pelas produções audiovisuais, que aumentou a partir da Olimpíada, nos deu força para criar o “LAB TAKE 441”, nosso Laboratório Audiovisual do CIEP 441 Mané Garrincha. Na verdade, o “LAB TAKE 441” nasceu assim que terminamos os trabalhos com a Olimpíada e entregamos tudo no dia 5 de agosto de 2021. Pronto! Foi quando começou a indignação coletiva. “Como assim ‘acabou’, professora? Aprendemos tudo isso para produzir apenas um vídeo e fim? Não! Temos que fazer uma ‘Escola de Cinema’”.

Quando falei com a direção da escola, eles não pestanejaram, logo organizaram um local para nossos encontros, a Casa de Cultura. Esse apoio não parou por aí! O diretor marcou o dia para a aula inaugural e convidou o cineasta Heraldo HB, do Cineclube Mate com Angú, para ministrar esse momento.

Em diálogos e reflexões com o professor Alexandre Magno, percebemos que o que queríamos desenvolver na escola era um laboratório audiovisual, um lugar de pesquisa, de aprendizado, de produção e de práticas. O LAB TAKE 4414 é a “nave mãe” que abarca vários projetos. O primeiro deles, que surgiu a partir da Olimpíada, é a “Escola de cinema”, que é a multiplicação do saber adquirido na Olimpíada através dos estudantes que viveram a experiência de sua 7ª- edição. Eles são os monitores das oficinas – preparam e organizam tudo com base no material da Olimpíada, sob minha orientação, e conduzem os encontros em duplas.

O segundo projeto é o “Cine Clube do Mané”, que acontece de quinze em quinze dias. Exibimos produções, seguidas de roda de conversa sobre o que foi apresentado. O terceiro grande projeto são os “Minicursos”, também ministrados pelos estudantes. O primeiro minicurso foi sobre o aplicativo Canva, ministrado pela aluna Gabriela Guedes, da turma de 2005. Tanto ela como os alunos que participaram da formação receberam certificação. O quarto projeto é a “Escola de formação inovadora”, em que o professor Alexandre Magno, eu e outros educadores parceiros daremos cursos direcionados ao corpo docente de nossa escola para apresentar as diversas possibilidades de uso das novas tecnologias dentro e fora da sala de aula.

Muitos são os projetos abarcados pela “nave mãe” LAB TAKE 441. Mas para que tudo isso se tornasse realidade e ganhasse corpo, contei com o apoio da diretora Ana Carla de Campos Alves e do diretor-adjunto Sidney Cardoso Santos Filho. Pessoas extremamente empreendedoras, com espírito inovador, que realmente acreditaram no projeto e buscaram parcerias para a criação do laboratório audiovisual. E conseguiram, pois, hoje, o CIEP 441 Mané Garrincha é uma Escola Criativa e de Oportunidades (Escola ECO). Realizado para homenagear Darcy Ribeiro, idealizador dos CIEPs e que no próximo ano completaria seu centenário, o projeto das Escolas ECO, idealizado pela SEEDUC, contemplou 50 CIEPs. E o nosso foi um deles, devido aos trabalhos desenvolvidos na escola, entre eles o sucesso da Olimpíada. Com isso ganhamos o laboratório audiovisual, o espaço maker, sala gamer, quadros interativos, container com aulas de robótica, entre outros recursos.

A Olimpíada passou por nós, nos sacudiu e nos moveu. Saímos da condição de espectadores das experiências para, de fato, protagonizá- las. São as vivências que dão sentido ao aprendizado adquirido. E foram elas que nos permitiram encontrar o nosso espaço, que segue gerando frutos e deixando vestígios para lá de positivos a toda nossa comunidade escolar.


Rosiane Paes Silva integra o grupo de 59.177 educadores(as) do país que participaram da Olimpíada neste novo formato. Graduada em Letras pela Universidade do Grande Rio (Unigranrio), Rosiane tem especializações em tradução, ensino religioso e educação empreendedora pela Universidade Federal Fluminense (UFF). É professora de Língua Portuguesa e Espanhola no Centro Integrado de Educação Pública (CIEP) 441 Mané Garrincha, em Pau Grande, Magé (RJ), onde atua também na coordenação pedagógica.


Notas de rodapé

1. Para assistir Turistando de bike pelo caminho do ouro, acesse <https://youtu.be/8UiHfxRUpQE>.

2. Parte inerente ao conteúdo a ser estudado na Olimpíada, onde são abordadas as relações entre documentário, cinema e jornalismo, bem como um detalhamento sobre os diversos tipos de documentário. Confira em <https:// www.escrevendoofuturo.org.br/caderno_virtual/caderno/ documentario>.

3. Para assistir O passageiro, acesse <https://youtu.be/sUHlwWPRWsI>.

4. Para conhecer o LAB TAKE 441, acesse <https://youtu.be/7PXoeffucc4>.

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