"Uma revista para educadoras(res) e apaixonadas(os) pela Língua Portuguesa"
História para ninar Cassul-Buanga
História para ninar Cassul-Buanga
texto - Nei Lopes; ilustração - Valentina Fraiz
01 de novembro de 2022
Sonhar um sonho tão bonito
Um dia, Cassul-Buanga, alguns chegaram:
A pólvora no peito, uma bússola nos olhos
E as caras inóspitas vestidas de papel. Vieram numa nau de velas caras, Bordadas de cifrões.
Suas mãos eram de ferro
E falavam um dialeto
De medo e ignorância.
E fomos.
Amontoados, confundidos, fundidos, estupefatos
Nossas dignidades eram dadas mar atrás
Aos peixes.
Chegamos:
Nosso suor foi o doce sumo de suas canas
- nós bagaços.
Nosso sangue eram as gotas de seu café
- nós borras pretas. Nossas carapinhas eram nuvens de algodão,
Brancas,
Como nossas negras dignidades
Dadas aos peixes.
Nossas mãos eram sua mão-de-obra.
Mas vivemos, Cassul. E cantamos um blues!
E na roda de samba
De roda
Dançamos.
Venceram quase todas as competições.
Nossos poemas formaram um grande rio.
E amamos e nos demos.
E nos demos e amamos.
E de nós fez-se um mundo.
Hoje, Cassul, nossas mulheres
- os negros ventres de veludo –
Manufaturam, de paina, de faina
Os travesseiros
Onde nossos filhos,
Meninos como você, Cassul-Buanga,
Hão de sonhar um sonho tão bonito...
Porque Zâmbi mandou. E está escrito.
Sobre o autor
Nei Lopes é compositor de música popular e escritor. Na área musical é autor de vasta obra gravada, sobretudo no gênero samba. Em literatura, é autor de 44 livros, entre obras de ficção, poesia e de referência, como o Dicionário da História Social do Samba, parceria com Luiz Antonio Simas, eleito Livro do Ano pelo júri do Prêmio Jabuti, em 2015. Por sua obra, é laureado com títulos de doutor honoris causa concedidos pelas universidades UFRJ, UFRRJ, UFRGS e UERJ.
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