Conformados e realistas
Tostão
Fernando Calazans e poucos outros jornalistas esportivos têm sido críticos e realistas sobre a qualidade e o futuro do futebol brasileiro, da Seleção e dos clubes. Penso da mesma forma. Estamos preocupados. Já a numerosa turma do oba-oba, também chamada de otimista, acha que somos muito pessimistas.
Os conformados, os que têm pouco senso crítico e também os modernistas, que são muito bem preparados cientificamente, dizem que o futebol moderno é esse aí. Temos de engoli-lo. Tocar a bola e esperar o momento certo para tentar fazer o gol virou sinônimo de lentidão. Confundem modernidade com mediocridade.
Ninguém é tão ingênuo para achar que se deve jogar hoje no estilo dos anos 60. O que queremos é ver mais qualidade. Não podemos nos contentar com um futebol medíocre, quase só de jogadas aéreas e de muita falta e correria. O encanto do futebol é outro.
Os jogadores são produzidos em série, para exportação, como uma fábrica de parafusos. Os atletas de talento são colocados na mesma linha de produção dos medíocres. Há mercado para todos. Aumentou a quantidade e diminuiu a qualidade.
Nos últimos 14 anos, a Argentina ganhou cinco mundiais sub-20 (acontecem de dois em dois anos), além de duas medalhas de ouro nas Olimpíadas. O time que derrotou o Brasil tem sete jogadores da equipe campeã mundial sub-20 em 2005.
Muitos vão dizer, com um ótimo argumento, que nesse período, o Brasil ganhou duas copas do mundo e mais um vice, enquanto a Argentina não venceu nada. A razão disso é óbvia. A Argentina não teve um único fenômeno nesses 14 anos, até chegar Messi. Já o Brasil teve Romário, Ronaldo, Rivaldo, Ronaldinho e Kaká. Todos os cinco ganharam o título de melhor do mundo.
Os fenômenos, em todos os esportes, dependem muito menos das condições em que são treinados. Eles não têm explicação. Mas não se pode depender tanto deles. É preciso criar boas estruturas e estratégias para formar um número maior de excelentes atletas. Esses têm diminuído no futebol brasileiro.
Muitos treinadores brasileiros conhecem tudo de esquema tático, de estatísticas, dos adversários, porém conhecem pouco as sutilezas e subjetividades. Não são bons observadores. Quem não sabe ver não sabe nada. Eles se preocupam mais com seus esquemas táticos que com a qualidade do jogo e se os melhores jogadores estão nos lugares certos.
Há exceções. Enfim, apareceu um técnico brasileiro que colocou Carlos Alberto na posição certa, se movimentando na frente, por todos os lados, e mais perto do gol, onde pode e deve driblar. Assim ele jogou no Porto com José Mourinho. Carlos Alberto não é armador, organizador, como atuava.
Felipão estava louco para ver Robinho no Chelsea porque precisa de um atacante rápido, habilidoso, que joga melhor pelos lados e que é capaz de marcar no próprio campo e aparecer com facilidade no ataque. Robinho é um desses raros jogadores. Se Felipão fosse treinador da Seleção, certamente faria o mesmo.
O Povo Online, 30/8/2008.