Você é contra ou a favor do incentivo à produção e ao consumo de alimentos transgênicos? E o que você pensa a respeito da igualdade de direitos e deveres para homens e mulheres? Você acha injusto que um negro ou um pobre entre na universidade pública com uma nota menor que a dos candidatos não cotistas? E, a seu ver, que medidas deveriam ser tomadas em relação às populações que moram nas margens da represa que abastece uma cidade? O aumento da criminalidade teria alguma relação com a injustiça social?
Desde a hora em que nos levantamos até a hora em que vamos dormir, essas e outras questões nos instigam, pois envolvem fatos socialmente relevantes: a escassez e a distribuição desigual de alimentos no planeta; o papel e o comportamento do homem e da mulher na sociedade; o “funil” do vestibular e o sistema de cotas para ingresso na universidade; a poluição das águas; ou, ainda, a insegurança cotidiana de nossas grandes cidades.
Como afetam direta ou indiretamente a vida de todos – na cidade, no Estado, no país ou no mundo –, essas e muitas outras questões são de interesse público. Referem-se, em geral, a problemas que demandam soluções mais ou menos consensuais, decisões a serem tomadas, rumos a serem seguidos, valores a serem discutidos e/ou relembrados etc. E a resposta que se der a cada caso afetará a vida de populações inteiras, fechando ou abrindo possibilidades, estabelecendo rumos, fixando parâmetros para as escolhas e ações das pessoas. São, portanto, questões polêmicas: estão em aberto, em processo de ampla discussão social.
Um dos objetivos principais deste Caderno é motivar alunos e professores a (re)conhecer questões polêmicas que atravessam nosso cotidiano. Afinal, entender o que está em jogo em cada caso, perceber “quem é quem”, certificar-se de interesses em disputa, estratégias em ação etc. são formas eficazes de se envolver nas questões que movem a vida em sociedade. Debatê-las, colaborando para a formulação coletiva de respostas, é parte da vida política cotidiana numa sociedade democrática. É parte, portanto, do pleno exercício da cidadania.
É nesse âmbito do interesse público e da construção da cidadania que o jornalismo se movimenta. As matérias dos mais diferentes veículos ditos “de imprensa” – jornais, revistas, sites, telejornais etc. – pretendem nos contar o que acontece à nossa volta. Analisar e comentar esses fatos faz parte dessa função tipicamente jornalística, que é oferecer ao público em geral um retrato o mais fiel possível da realidade, colaborando para sua análise, discussão e transformação.
Retratar a realidade e contribuir para a reflexão a seu respeito são, portanto, as duas intenções básicas do jornalismo. De forma geral, as matérias não assinadas, especialmente a notícia, procuram nos dar, na medida do possível, uma descrição objetiva e imparcial dos fatos que relatam. Já as matérias assinadas, como os editoriais, os artigos de opinião, as críticas, as resenhas, as grandes reportagens etc., se esforçam para analisar e discutir esses mesmos fatos.
Assim, matérias jornalísticas como a notícia apresentam-se ao público como “anônimas” e “neutras”. Não possuem marcas explícitas de autoria, como o verbo em primeira pessoa e ideias ou preferências individuais; por isso mesmo, evitam emitir opiniões explícitas, assumir um ponto de vista. Na notícia, é como se os fatos falassem por si: “Aconteceu, virou Manchete”, dizia, muito sintomaticamente, a publicidade de uma revista semanal já fora de circulação. Evidentemente, fatos não falam por si. Portanto, toda matéria jornalística, por mais objetiva e imparcial que se pretenda, manifesta uma versão particular dos fatos. Basta ler a mesma notícia publicada em diferentes veículos de imprensa para se dar conta disso. Seja como for, o foco do interesse, numa matéria não assinada, é a informação, e não o que determinada pessoa ou órgão de imprensa pensa a respeito dela.
Já as matérias assinadas, como o próprio nome indica, são autorais. Os fatos chegam ao público “filtrados” pelo ponto de vista do articulista (autor do artigo), que opina sobre eles, comentando, discutindo, avaliando etc. E quem as lê quer saber, com muita clareza, o que quem escreve pensa a respeito de determinado assunto, bem como por que pensa nesses termos, e não em outros.
Articulistas
São profissionais ou especialistas que escrevem matérias assinadas (autorais) sobre algum assunto que está sendo discutido na mídia impressa, internet ou televisão. No caso particular do artigo de opinião, o articulista é convidado por uma empresa jornalística para escrever porque é reconhecido, tanto por ela como pelos leitores, como alguém que tem uma contribuição própria relevante para o debate. Por isso mesmo, nem sempre sua opinião coincide com a do veículo para o qual escreve. E é por esse motivo que ele assina o artigo, responsabilizando-se pessoalmente pelo que diz. A assinatura revela sua identidade, que se completa com seu currículo, geralmente inserido no final da matéria.
Este Caderno trabalha com um dos gêneros mais conhecidos de matéria assinada: o artigo de opinião. Ele pode ser publicado em jornais, revistas ou internet; e é assinado por um articulista que, jornalista profissional ou não, normalmente é uma autoridade no assunto ou uma “personalidade” cujas posições sobre questões debatidas publicamente interessam a muitos. É o que explica a relativa frequência com que celebridades da cultura pop, por exemplo, são convidadas a se pronunciar sobre o que pensam a respeito de questões sobre educação, saúde pública etc., mesmo quando estão longe de ser especialistas no assunto. Não por acaso esse conjunto de protagonistas dos debates públicos faz parte de um grupo a que se dá o nome de “formadores de opinião”.
Sem as questões polêmicas de que já falamos, não existe artigo de opinião. Elas geram discussões porque há diferentes pontos de vista circulando sobre os assuntos que as envolvem. Assim, o articulista, ao escrever, assume posição própria nesse debate, procurando justificá-la. Afinal, argumentos bem fundamentados têm maior probabilidade de convencer os leitores. Ao escrever seu artigo, o articulista toma determinado acontecimento, ou o que já foi dito a seu respeito, como objeto de crítica, de questionamento e até de concordância. Ele apresenta seu ponto de vista inserindo-o na história e no contexto do debate de que pretende participar. Por isso mesmo tende a incorporar ao seu discurso a fala dos participantes que já se pronunciaram a respeito do assunto, especialmente os mais marcantes. Aprender a ler e a escrever esse gênero na escola favorece o desenvolvimento da prática de argumentar, ou seja, anima a buscar razões que sustentem uma opinião ou tese. O tema do concurso – “O lugar onde vivo” – estimula a participação nos debates da comunidade, ajuda a formar opinião sobre questões relevantes e a pensar em como resolvê-las. Portanto, escrever artigos de opinião pode ser um importante instrumento para a formação do cidadão.