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Por meio de perguntas, você vai ajudar a turma a “ouvir” melhor o autor da crônica. As(Os) estudantes vão começar a se relacionar com o texto como futuras(os) escritoras(es).
Machado inicia o texto nomeando como crônica aquilo que escreve. Dirige-se explicitamente ao leitor, indicando que conversa com ele. Esse preâmbulo leva o leitor a se sentir considerado e, por isso mesmo, a aceitar o convite para ler a crônica.
Logo no parágrafo seguinte o autor conta quem é a personagem central, um burro como tantos outros. Apresenta também o conflito que move a narrativa: uma cena de quase morte. Mas observe como ele apresenta tudo isso: diz que ali não seria um lugar para descanso, indicando certa recriminação: “O que faz esse burro aqui?”. Ele, no entanto, não faz a recriminação explicitamente. A recriminação implícita introduz um tom levemente irônico ao texto.
“O burro não comeu do capim, nem bebeu da água; estava já para outros capins e outras águas, em campos mais largos e eternos.” Essa frase acentua o tom irônico do texto, jogando com a oposição entre elogio e recriminação. Precede o elogio com uma frase em que aparecem palavras recriminatórias: diz que o burro “não foi abandonado inteiramente”, isto é, foi abandonado, ainda que não de todo; emprega “alguma piedade” para dizer da quase ausência desse sentimento. Além desse jogo, usa eufemismos para falar da morte: “em campos largos e eternos”, reforçando o tom irônico.
O tom irônico continua quando aponta para aquilo que o menino faria, mas não fez (enquanto o cronista estava presente; nada garante que não tenha feito depois), e quando exagera o valor da descoberta: poucos minutos valeram uma, duas horas, um século! E, mais que isso, a experiência vivida foi exageradamente importante, o que vale como matéria de reflexão para os sábios! Como se vê, o exagero também é um recurso para a construção da ironia.
O burro é o símbolo da ignorância, daí o inédito (irônico) de estar meditando. Essa situação servirá para que o cronista/narrador faça uma reflexão. Começa comparando-se com Champollion (o sábio francês que decifrou a escrita egípcia), exagerando sua própria importância: decifrará os últimos pensamentos do burro – que só medita porque está morrendo, não o fazendo enquanto viveu. E quando usa o ditado popular “por pensar morreu um burro” leva o leitor a aproximar-se de certo tipo humano.
E para confirmar essa aproximação Machado prossegue a narrativa, dando voz ao próprio burro, que fala de si como se fosse humano. “Por mais que vasculhe a consciência, não acho pecado que mereça remorso.” A metáfora do burro vai se delineando: diz respeito a um tipo humano, que se ajusta, aceita o destino, pensa de maneira simplista e moralista.
Ao continuar a confissão, o animal prossegue indicando as ações que o aproximam de muitos humanos. A transposição de elementos da esfera do humano para a do animal irracional é um recurso de distanciamento usado pelo autor, que leva o leitor a perceber melhor a crítica feita ao tipo de humano que valoriza a submissão e a conformidade. A crítica do autor a esse tipo de vida se evidencia ainda mais na filosofia expressa pelo burro, a única que ele pode ensinar: a valorização do porte grave e do controle dos sentidos, ou seja, sua filosofia tem a profundidade das aparências.
Depois da confissão do burro, o cronista começa a se despedir do leitor. “Não percebi o resto, e fui andando.” Continua seu caminho, abandonando o bicho à sua sorte, mas ainda ironizando: diz-se triste ao ver morrer tão bom pensador, mas isso é um pretenso elogio, pois até então não fez mais que depreciar o modo de vida do animal. Nota-se o tom de lástima assumido pelo cronista quando considera que outros burros continuariam a viver.
Ao final do parágrafo, apresenta sua grande pergunta, aquela que foi delineada no início da crônica: por que não se investigar o moral do burro? Fica implícita uma exagerada e, por isso, falsa convocação: “Sábios, estudem o moral do bicho!”.
Na sexta-feira, ao passar pelo mesmo local, o cronista encontrou o animal já morto. A marcação do tempo cotidiano define o gênero da narrativa, a crônica. O narrador deixa claro que seu texto foi escrito com base na observação dos lugares que se percorre cotidianamente, os lugares familiares que se transformam conforme o momento: na quinta à tarde o burro agoniza; na sexta pela manhã está morto; na sexta à tarde, nem cadáver havia. Eis aqui o material da crônica.
O autor finaliza o texto retomando sua reflexão a respeito da natureza do animal: nem inventou a pólvora, nem seu sucedâneo mais terrível na época, a dinamite, e o despacha: que descanse em paz!
Vocabulário: O autor faz uso de um vocabulário rico e variado, incluindo termos específicos relacionados ao tema central, como “capim”, “trilhos de bondes” e “anca do burro”. Isso contribui para a criação de um ambiente mais detalhado e realista.
Uso de pronomes: O autor utiliza pronomes pessoais, como “eu” e “ele”, para criar uma conexão direta com o leitor e tornar a narrativa mais envolvente.
Uso de adjetivos e advérbios: O autor faz uso de adjetivos e advérbios para descrever e qualificar os elementos da crônica. Ele utiliza esses recursos para fornecer detalhes sensoriais e criar uma imagem vívida dos eventos e personagens.
Tempos verbais: O autor emprega predominantemente o tempo verbal no pretérito perfeito (“vi”, “determinei”, “achou”), que indica ações passadas e cria um tom narrativo. No entanto, também há o uso do presente do indicativo (“agora”, “receio”, “parecerá”), que traz uma sensação de atualidade e envolvimento do leitor. Além disso, a mudança entre tempos verbais indica a alternância entre a observação dos fatos passados e a reflexão atual do narrador.
Verbos modais e auxiliares: Machado faz uso de verbos modais e auxiliares, como “poderia”, “deveriam” e “seriam”, para expressar possibilidades, obrigações e condicionalidade. Isso contribui para a construção de argumentos ao longo da crônica.
Discurso direto e indireto: O autor mescla o discurso direto e indireto ao incorporar os pensamentos e reflexões do burro. O discurso direto é usado quando o narrador reproduz as falas do burro consigo mesmo, enquanto o discurso indireto é utilizado para expressar as reflexões e considerações mais profundas do animal.
Estruturação textual: A crônica de Machado de Assis segue uma estrutura bem definida, com início, meio e fim. O autor organiza os parágrafos de forma a conduzir o leitor pelos eventos e reflexões, construindo um argumento progressivo.